Quem são ‘eles’? São pessoas ou instituições das quais falamos, geralmente, em tom crítico, nem sempre com tanta ou toda a razão que cremos ter: qualquer um que, num dado momento, seja considerado merecedor da nossa insatisfação, discordância, reivindicação, revolta, fofoca, maledicência e intriga. Às vezes, ‘eles’ são os destinatários dos nossos comentários elogiosos.
As pessoas mais interessantes, cujos comentários e ponderações que fazem podem ser os mais agradáveis e aproveitáveis, costumam ser as melhores ouvintes e, se não puderem falar, não ficam agoniadas e irritadas: sabem aguardar o momento propício. Dentre estas, estão as que somente falam de outra, ausente, de modo construtivo, verdadeiro ou, caso seja em tom divergente, antes, já o fizeram diretamente à própria pessoa; focando o comportamento e não a pessoa. Para o elogio ou para a crítica, pautam-se pelo empenho em dar a dose certa, sem exageros tendenciosos. Quando erram, têm percepção para notar e humildade para admitir, se alertadas; grandeza para pedir desculpas, ainda que sejam negadas ou aceitas só da boca para fora.
Quem se arrisca aos prós e contras da autenticidade e franqueza precisa ser sereno, forte, sensato e, mesmo que o seja, principalmente se for “santo de casa”, por muita gente é tido como chato, anti social, grosso, intolerante e intrometido (às vezes, poderá sê-lo mesmo). Não será dos mais populares e requisitados. Sabe o que é e pratica a empatia e é vítima fácil da antipatia.
Os referidos no parágrafo anterior são humanamente suscetíveis a uns momentos de gabarolas, ególatras, fofoqueiros, fariseus e traiçoeiros; ocasiões nas quais se somam aos que só sabem falar muito e bem de si mesmos, e muito e mal dos outros. “As boas maneiras consistem em esconder o quanto pensamos bem de nós mesmos e o quanto pensamos mal dos outros.” “O primeiro prazer da pessoa é falar de si mesma e o segundo prazer é falar dos outros”. Isto é humano e não necessariamente ruim: depende da intenção, intensidade e frequência, de quando, onde, com quem e como fazê-lo. É tendência até das pessoas mais íntegras e preparadas. Há diferença no propósito e força para combater, mas, não existe a ausência do desejo e da prática.
Somos todos nós um bando de falsos e “lavadeiras”? Não. Tanto quanto nos é impossível falar com a mesma rapidez com que pensamos, igualmente nos é impossível ter sinceridade total (e nem recomendável). O que não nos justifica a falsidade integral. Nem a atitude ‘moeda’: beijar à frente e morder pelas costas. Nem tampouco a atitude ‘vaselina’: o ‘bagre ensaboado’ e escorregadio, que molda suas falas, caras e atos conforme o interlocutor ou grupo, à base de mentiras e omissões, mesmo que seja pessoa honesta a serviço de objetivo digno.
A evolução pessoal – e profissional – vai se fazendo conforme optemos por saber escutar, o que não é apenas calar; por saber guardar sigilo e discrição sem confundir com omissão; por não distorcer o dito, nem minimizar ou exagerar; por considerar a hipótese de errar, ser incompreendido ou não compreender; por admitir que o outro pode acertar, mesmo que não gostemos ou concordemos com ele; e por aí vai. Tempo necessário para esta prática? Toda a vida. Não há colação de grau e sim o aperfeiçoamento constante, que consiste menos na eliminação dos defeitos, limites e erros, e mais na sua identificação, aceitação e redução à menor frequência e intensidade possíveis.
A injustiça e a impunidade reinantes dão desejo de “jogar a toalha”, porém, esta só é jogada pelas pessoas comuns, que desistem de antemão, tão logo surja a primeira dificuldade e derrota, ou, melancolicamente, afundam na própria mediocridade, sem percebê-la. Há ideias, sentimentos e ações que não cabe julgar nem se conseguiria; só passando por situação semelhante para ter noção. Entretanto, pessoas notáveis se destacam até na adversidade e tendem a colher os frutos do que plantam: relacionamentos pessoais e profissionais mais interessantes e profícuos.
A linda e pouco praticada fábula dos três crivos recomenda: antes de falar de alguém, pergunte-se se o que dirá tem verdade, bondade e utilidade. E é sempre providencial que a gente se toque que ‘eles’ também somos nós: eu e você! Portanto, cada vez que for falar de alguma pessoa, mesmo que alegue ser do comportamento dela, para alguém ou para todo o mundo, menos a ela diretamente, lembre que naquele momento você poderá ser o assunto de gente, até da sua total confiança, exatamente porque você está ausente. Se a honestidade e o bom senso que você assegura possuir realmente forem reais, um pouquinho ao menos, talvez, você pense melhor no que dirá de uma pessoa, pelas costas dela.
José Carlos de Oliveira